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segunda-feira, janeiro 23, 2006

cadilhos....

 

22 de Janeiro de 2006, dia de eleições presidenciais

do choro, dos cadilhos e do mar

De manhã, fui ver o mar. O mar da Caparica. Ontem, a Verónica, brasileira carioca, dizia-me que o mar era universal e que, de onde quer que ele se olhasse, enchia sempre a alma, no mesmo cantinho e da mesma forma, dependendo do vazio que o olhar do mar iria preencher.

Hoje ainda lembrei-me da minha avó Brita. Lembrei-me da alcofa que transportava debaixo do braço, cheia de molhos de nabiça, rabanetes, coentros e salsa, se calhar, alguns figos embrulhados às meias dúzias, em folhas de figueira, verdes e carnudas, capazes de albergar dentro de si, uma boa meia dúzia de figos maduros e prontos a comer.
Usava um lenço preto que lhe cobria a cabeleira já rala, branca, que enrolava num carrapito atrás na nuca e que prendia com um gancho, que julgo simples. Pelos dias mais invernosos, usava sobre os ombros um xaile de lã, igualmente preto, em forma de triângulo pouco equilátero, que lhe cobria pouco mais do que os ombros e um pouco da parte superior dos braços. Era ela mesma que tricotava os seus xailes, aos quais depois de tricotados, ensarilhava nas pontas mais oblíquas do triângulo pouco equilátero, uma série de cadilhos que lhe ornavam as margens e pendiam sobre os ombros e as costas.

E chorei pelas saudades da minha avó, pelas saudades das árvores do meu quintal, das frutas que via crescer, amadurecer e que depois comia gulosamente, algumas antes de tempo, contra as recomendações dos adultos, que vaticinavam o crescimento de piolhos, a quem comia fruta antes do tempo.

Tornei a chorar, de mansinho, mas com imensa tristeza, quando percebi o não retorno dos números que apareciam na televisão como resultados de um eleição para o mais alto cargo da nação. Mandam as regras democráticas que se aceitem e respeitem os resultados do sufrágio, mas dita-te a minha cultura, a minha vida, os meus acreditares, essas coisas todas de que sou feita, que não me cale. E não me calarei! Como me dizia hoje a minha amiga Lina, “ter medo, mete medo!”.
E sobre este assunto, embargam-se-me as letras, confundem-se-me as vogais e as consoantes e preciso urgentemente de ir à procura de uma pontuação e de uma sintaxe novinha em folha, a estrear como quem percorre um caminho novo.

E hoje é o primeiro dia do resto da minha vida! (se alguém perguntar, eu explico porquê). Posted by Picasa

1 comentário:

Diafragma disse...

São choros muito diferentes, os do teu bonito texto. E muito se poderia escrever sobre eles.