Ela tinha 13 anos, ele tinha 11 e andavam na escola. Começaram o namoro e dois anos depois ela engravida. Constituem família. Ele há-de concluir o 6º ano e ela o 9º. A filha tem agora 17 anos.
Em Outubro do ano passado, ele, Ricardo, bebeu mais do que a sua lucidez suportava e deu-lhe 3 estaladas na cara e uma dentada no braço.
Ela, Vanessa, teve medo, não reconheceu o seu fiel companheiro de infância, de adolescência e de vida. Não reconheceu o seu Ricardo. É pacifica, diz e não aceita a violência sob nenhuma forma, muito menos vinda do seu companheiro.
Chamou a polícia, pediu ajuda aos amigos e saiu de casa levando a filha consigo. Apresentou queixa contra ele por violência doméstica.
Uma semana depois ele telefonou-lhe. Encontraram-se, conversaram, ele pediu-lhe desculpa, disse-lhe para voltar para casa e acertaram a vida a partir daí cada um para seu lado.
Ele foi viver com um amigo e ela regressou com a filha à casa que é dele, por morte de seus avós.
Tinham pedido um empréstimo para fazer obras. Na data dos factos, o empreiteiro tinha-se ido embora, levado o dinheiro consigo e abandonado a obra por concluir. Muito stress, adianta, uma altura má da vida.
As prestações no banco, essas, continuavam e continuam a correr, todos os meses, em dia certo.
Cada um ganha 500.00 euros por mês em trabalhos que não são precários, com categorias profissionais que começam pelo pomposo nome de Assistente ...
Trabalham todos os dias`da semana. Ele entra às 8h da manhã, ela tem horário incerto, trabalha por turnos e por vezes sai muito tarde.
Partilham o empréstimo das obras, cada um paga 200 euros. Ela fica com 300 euros com os quais se sustenta a si e à filha. Ele fica só com 200, porque precisa pagar 100 euros para o quarto onde vive.
Quando a Vanessa sai tarde, ele fica em casa, a fazer companhia à filha, para que não fique de noite sozinha em casa, porque´o bairro é duvidoso.
Quando ela chega a casa, ele termina a sua função de pai vigilante. Umas vezes vai embora, outras, fica a dormir no sofá da sala porque de manhã pega ao trabalho muito cedo. É assim há quase um ano.
São ambos bonitos, educados, civilizados, exprimem-se bem, sorriem quando falam e quem olha para eles acredita que a vida nunca os poderá trair.
Talvez voltem a viver juntos, dizem...
Ele ainda não pensou nisso, embora ache que é isso que vai acontecer, mas por enquanto está muito bem assim. A dar-se um tempo!
Ela, já pensou nisso, também acha que a vida os juntará de novo, mas por enquanto quer ficar assim ... a dar-se um tempo, a dar-lhe um tempo.
Não têm namorados, nem querem.
Querem apenas viver separados e sozinhos, tal como estão.
Ela, insistentemente inquirida sobre casos semelhantes no passado, disse não existirem, nunca terem existido. Que se tinham zangado em 2003 e tinham chamado nomes um ao outro. E que em 20 anos de relacionamento, exisitiam bons e maus momentos, e que achava isso normal. Normal já não achava a bofetada.
Sol e chuva sim, mas bofetada não.